
– Eu nunca cuidei dos pobres. Eu não sou São Francisco de Assis. Até porque a primeira vez que eu tentei carregar um pobre no meu carro eu vomitei por causa do cheiro – disse Greca num debate. Depois, alegou que a frase foi descontextualizada.
De fato, como disse em artigo sobre esta confissão insólita o jornalista José Carlos de Assis, nunca pensamos que Justo Veríssimo, o personagem politicamente incorreto de Chico Anísio, iria nos aparecer um dia na pelo de um candidato real. “Detesto pobre. Pobre tem que morrer”, dizia Justo Veríssimo lá pelos anos 80. Ele era a síntese do politicamente incorreto porque o Brasil era outro.
Havia saído da ditadura e tentava ser um país melhor. Uma nova Constituição lançara as bases de um Estado de bem-estar social. Longe de fortalecer preconceitos, pelo contrário, os absurdos ditos por Justo Veríssimo fortaleciam a rejeição ao elitismo e estimulavam o sentimento construtivo da fraternidade.
Uma parte dos brasileiros começou a externar sua ojeriza aos pobres justamente quando um presidente, agora também perseguido, implantou as mais aguerridas políticas de combate à pobreza que o pais já teve. E aí começaram as lamúrias da classe média conservadora contra os pobres. Ganhavam Bolsa Família e não queriam mais trabalhar. Ascendiam socialmente e entupiam os aeroportos, entrando esmolambados e de chinelas nos aviões, sentando-se na poltrona errada. Com o Pro-Uni, deram para ingressar em faculdades privadas. Com as cotas, os pobres e negros, pois uma coisa anda junto com a outra, passaram a disputar com favorecimento vagas nos concursos e nos vestibulares. Deram para frequentar os shoppings, e com esta invasão de produtos chineses, para desfilar com falsas bolsas da Chanel e da Louis Vitton. Com a isenção do IPI, compraram seus carrinhos e contribuíram para infernizar o trânsito. Ah, estes pobres metidos a besta. E estas domésticos, exigindo jornada de oito horas e FGTS regulamentados pela Dilma…
O que Greca verbalizou foi este sentimento coletivo difuso contra os pobres, que deixou de ser politicamente incorreto.
Agora, tudo está voltando ao normal, devem dizer aliviados para seus próprios botões. O desemprego colocou muitos pobres em seu devido lugar. A recessão levou de volta para as casas das famílias muitas domésticas que haviam conseguido emprego no comércio, na indústria e na construção civil. Estes programas sociais, mais dia, menos da, vão ser restringidos na era da austeridade fiscal.
O que Greca disse – que preferiu transferir para a Igreja Católica a gestão de um abrigo social – está sendo dito com eufemismos pelos novos donos do poder político: O Estado tem que ser mínimo e deixar que estes problemas sejam resolvidos pelo mercado. No máximo, pelas Igrejas, as Ongs e outras organizações que gostam de pobres e não vomitam ao sentir o cheiro deles.
***

Sobre o Fundador
Guaraci Primo é o criador e editor do Blog Seu Guara, fundado em 2008. Natural do Paraná, é bacharel em Administração e ex-servidor da Previdência Social e do Banco do Brasil.
Apaixonado por futebol e atento às transformações políticas e sociais do país, criou o blog como um espaço para unir informação, opinião e reflexão, sempre com responsabilidade e respeito ao leitor. Ao longo dos anos, consolidou um projeto reconhecido pela credibilidade, pelo equilíbrio editorial e pela valorização do pensamento crítico.
Guaraci acredita na comunicação como um instrumento democrático e busca oferecer um ambiente livre, acessível e plural, onde todos possam se expressar de forma civilizada e respeitosa,
atua de forma independente na produção de conteúdos sobre futebol e política.
Acredita na informação como instrumento de cidadania e na internet como um espaço democrático para o diálogo, a reflexão e a livre expressão, sempre com respeito e responsabilidade.
Contato: contato@seuguara.com.br