Ninguém é mais direitista do que um ex-esquerdista. Talvez porque a desilusão
com as promessas nunca realizadas da esquerda se misture com a necessidade do
novo direitista de exorcizar seu passado, de se autopunir pela sua ingenuidade.
Para repudiar o que era, o ex-esquerdista precisa arrasar o que era. Como está
também arrasando o seu passado, a sua juventude e o tempo que perdeu acreditando
em coisas como igualdade, solidariedade e a redenção da humanidade, não admira
que sua crítica à esquerda seja tão ácida. Está lamentando a si mesmo, o que só
aumenta sua raiva.
O adágio, tão repetido, segundo o qual quem não é de esquerda até uma certa
idade não tem coração e quem não é de direita depois não tem cérebro, equipara a
migração da esquerda para a direita como uma conquista da sabedoria.
Idealismo, crença em justiça social etc. seriam coisas que iríamos largando pelo
caminho rumo à maturidade, junto com outras baboseiras juvenis. Não se tem
notícia de uma migração ao contrário, de direitistas que voltam a ser
esquerdistas, até como uma forma de recuperar a juventude.
E esquerdistas que continuam esquerdistas apesar de já terem idade para se darem
conta do engano são alvos prioritários do escárnio dos convertidos. Ainda têm
coração, os inocentes.
Os neoconservadores que levaram a política externa americana a sucessivos
desastres nos últimos anos têm este nome porque muitos deles foram trotskistas
na juventude. Abandonaram o internacionalismo trotskista e inauguraram o
ultranacionalismo do “século americano”, e continuam influentes, mesmo sob o
governo do Obama.
Os ex-trotskistas odeiam o que foram um dia, e seu conservadorismo ativo é uma
forma de expiação. Caso notório de conversão foi a do escritor John dos Passos,
ex-comunista e autor de alguns livros memoráveis de crítica social, que acabou
seus dias quase como uma caricatura de direitista americano, com bandeira na
frente da casa e tudo.
Para quem ainda se considera de esquerda, apesar das desilusões e de um coração
combalido, o rancor dos convertidos tem seu lado positivo. Mostra que a esquerda
ainda existe, logo chateia. Ou chateia, logo existe.
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Sobre o Fundador
Guaraci Primo é o criador e editor do Blog Seu Guara, fundado em 2008. Natural do Paraná, é bacharel em Administração e ex-servidor da Previdência Social e do Banco do Brasil.
Apaixonado por futebol e atento às transformações políticas e sociais do país, criou o blog como um espaço para unir informação, opinião e reflexão, sempre com responsabilidade e respeito ao leitor. Ao longo dos anos, consolidou um projeto reconhecido pela credibilidade, pelo equilíbrio editorial e pela valorização do pensamento crítico.
Guaraci acredita na comunicação como um instrumento democrático e busca oferecer um ambiente livre, acessível e plural, onde todos possam se expressar de forma civilizada e respeitosa,
atua de forma independente na produção de conteúdos sobre futebol e política.
Acredita na informação como instrumento de cidadania e na internet como um espaço democrático para o diálogo, a reflexão e a livre expressão, sempre com respeito e responsabilidade.
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