Por Rudolfo Lago, no Congresso em Foco: Talvez tenha acontecido no Salão Nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) algo inédito na história brasileira. Ali, um sindicalista comandou uma assembleia da qual participavam, além de trabalhadores e estudantes, banqueiros e empresários. E o representante dos empregados mandou que os patrões dessem as mãos, as levantassem e cerrassem os punhos. Ao final, fez com que toda a plateia gritasse: “A sociedade unida jamais será vencida!”.
O país já teve outro momentos de união. Os comícios das Diretas, por exemplo, que levaram milhões às ruas. Mas o gesto simbólico de ação conjunta de trabalhadores, estudantes e patrões que foi organizado pelo presidente da Força Sindical, Miguel Torres, é, sem dúvida, um ponto de inflexão importante. O que se viu ali e em seguida na praça central da faculdade no Largo de São Francisco, acompanhado de outras ações semelhantes em todas as 27 capitais do país – foi algo impressionante.
À parte os interesses políticos e ideológicos de cada grupo, a sensação de democracia ameaçada de fato uniu a todos. No Salão Nobre, houve a leitura de uma carta motivada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Logo em seguida, no Largo de São Francisco, a carta da USP lida por homens e mulheres com características físicas, de cor e de raça que fizeram questão de inicialmente destacar para que os deficientes visuais também pudessem identificar as diferenças: negros, brancos, indígenas. O Hino Nacional encerrou o ato. Em seguida, artistas como Fernanda Montenegro, Antonio Fagundes, Chico Buarque, Gal Costa, Caetano Veloso e Maria Bethânia leram em um vídeo a carta. Emocionante.
O cientista político André Cesar, da Hold Assessoria, que dá consultoria a diversos grupos do mundo financeiro, considera que o que se viu nesta quarta-feira (11) a partir do Largo de São Francisco, em São Paulo, é, sem dúvida, um marco importante de união da sociedade brasileira em torno da defesa da democracia. No mínimo, neste momento, inibiu os ensaios de arreganhos autoritários do presidente Jair Bolsonaro e de seu grupo. Bolsonaro incomodou-se profundamente com as mais de 900 mil assinaturas, a essa altura, na carta da USP, e com as mais de cem adesões de diferentes instituições, menos e mais conservadoras, à carta da Fiesp.
Neste momento, já se evidenciou certo recuo de Bolsonaro. Ele foi levado, por exemplo, a desistir da ideia de transferir o desfile militar de Sete de Setembro no Rio de Janeiro do centro da cidade para Copacabana. Até porque os próprios militares não foram na sua onda.
O problema é que daqui para o dia Sete de Setembro ainda faltam 27 dias. No Sete de Setembro do ano passado, Bolsonaro ensaiou um arreganho e depois recuou. Como dizíamos aqui naquela ocasião, é assim que ele age, replicando na política uma estratégia militar: a tentativa de tomada de cabeça de ponte. Trata-se de tentar estabelecer um ponto de avanço no território inimigo. Se o inimigo cede, as tropas se estabelecem ali e avançam daquele ponto. Se o inimigo reage, recua-se da cabeça de ponte. No Sete de Setembro do ano passado, Bolsonaro recuou. Hoje, ensaia-se de novo recuar.
André Cesar avalia que esse agora é o desafio: manter até lá, e depois disso, Bolsonaro pressionado para não mais ensaiar avançar caso se sinta à vontade para isso.
O cientista político, porém, aponta para uma talvez fragilidade do ato desta quarta-feira que Bolsonaro poderá explorar. Simbolicamente, o Largo de São Francisco é o berço do Judiciário brasileiro. E o dia 11 de agosto o dia em que o ensino do Direito começou a acontecer no Brasil. Foi um tremendo tiro no pé, portanto, que, na véspera dos atos desta quarta-feira o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha resolvido conceder a si mesmo e ao restante do Judiciário aumento de salário. Não precisavam ter dado esse trunfo para Bolsonaro e sua trupe explorar. Sigamos na observação deste nosso país complicado…
Imagem: reprodução

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