“A ética é o ideal, mas a prática desonesta é a realidade. Pregamos a
ética para os outros. Queremos que eles se demonstrem éticos, mas nos reservamos
o privilégio de ser pragmáticos em benefício próprio.”
os elogios e críticas incidem sobre o mesmo traço de personalidade – ou postura.
Distingo. Traço de caráter pertence à pessoa. Incorporou-se à sua psique, por
educação ou decisão. Postura é consciente, é mais racional. No seu caso, parece
que psicologia e ética correm na mesma direção. No começo do mandato, esse
rigor, que também se exprime num apreço à liturgia do cargo sem precedentes faz
bastante tempo, dado que inclui uma seriedade quase puritana, era louvado.
Tínhamos uma dirigente que não fazia negócios. Com o tempo, tornou-se tema de
preocupação e mesmo de crítica. Ela não cede. Para votar uma lei, faz o mínimo
de acordos. Isso estressa as relações com os parlamentares e os partidos. Mas
aparentemente tem dado certo, isto é, as derrotas em alguns projetos de lei não
trouxeram resultado pior do que teria sido aceitar desfigurá-los.
Isso tem um custo político, que ela paga. Não é pragmática, queixam-se os
empresários. Não gosta de política, reclamam políticos e colunistas. Nos dois
casos, isso significaria que não escuta o outro, não quer ter notícias más, não
faz concessões. Mas é tênue a linha separando essa descrição, que delineia um
governante no limite do autoritário, e a do político sem princípios. Fazer uma
negociação, que é coisa boa, está a apenas duas ou três letras de fazer uma
negociata. Onde ficam as fronteiras da negociação, legítima, necessária na
política, e da negociata, sua caricatura, sua negação?
sociedade, não exatamente dela. Queremos ética na política, mas sabemos que na
prática não é bem assim. Desconfiamos que a ética, na política, não entrega os
bens desejados. Por isso, prestamos homenagem, da boca para fora, à moral, mas –
pragmaticamente – aceitamos infrações a ela. Isso não é raro. Já vi pessoas que
se indignavam com a desonestidade vigente mas sobrefaturavam a conta que
emitiam. Essa divisão na personalidade, essa contradição ética entre a fala
honesta e a prática desonesta, percorre a sociedade brasileira de cima em baixo.
Ninguém esquece o senador goiano que era um dos críticos mais veementes da
corrupção petista, estando, ele próprio, envolvido em negócios que lhe custaram
o mandato.”

Universidade de São Paulo, publicada no Valor Econômico. A íntegra pode
ser lida aqui. O
texto inteiro foi repercutido no blog SQN.

Sobre o Fundador
Guaraci Primo é o criador e editor do Blog Seu Guara, fundado em 2008. Natural do Paraná, é bacharel em Administração e ex-servidor da Previdência Social e do Banco do Brasil.
Apaixonado por futebol e atento às transformações políticas e sociais do país, criou o blog como um espaço para unir informação, opinião e reflexão, sempre com responsabilidade e respeito ao leitor. Ao longo dos anos, consolidou um projeto reconhecido pela credibilidade, pelo equilíbrio editorial e pela valorização do pensamento crítico.
Guaraci acredita na comunicação como um instrumento democrático e busca oferecer um ambiente livre, acessível e plural, onde todos possam se expressar de forma civilizada e respeitosa,
atua de forma independente na produção de conteúdos sobre futebol e política.
Acredita na informação como instrumento de cidadania e na internet como um espaço democrático para o diálogo, a reflexão e a livre expressão, sempre com respeito e responsabilidade.
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